Quando eu tinha seis anos, observava com olhos de quem
desvela o mundo, uma das maiores enchentes do Rio Itapicuru. Via a água chegar
perto da cancela da casa dos meus avós, enquanto o rio fazia vítimas. A casa
deles se enchia de crianças e de pessoas que ali guardavam seus móveis e até
traziam seus animais e pertences e ficavam lá por dias esperando as águas
baixarem. A casa também se enchia de um barulho ensurdecedor de vozes, de
risos, de correria e de cuidados para não chegarmos perto das águas que subiam,
infestadas de sanguessugas.
Hoje, com os mesmos olhos de encantamento pela beleza
indomada da natureza, carrego as preocupações de adulta, com as pessoas que
perderam seus bens, e com a própria natureza em si, que sofre com as
consequências da ação humana. Os mesmos olhos da menina que viu a canoa virar com Vera
Lúcia Reis, grávida, há 36 anos, são os olhos da adolescente encantada pelo rio
que banhava o terreiro da avó, perto da fonte, há 25 anos, e que permanecem na
adulta que ainda se encanta, mesmo de longe, com a beleza indomada das águas do
Itapicuru. Por Niclécia Gama.
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